A RAPOSA E AS UVAS Uma raposa, morta de fome, viu, ao passar diante de um pomar, penduradas nas ramas de uma viçosa videira, alguns cachos de exuberantes Uvas negras, e mais importante, maduras. Não pensou duas vezes, e depois de certificar-se que o caminho estava livre de intrusos, resolveu colher seu alimento. Ela então usou de todos os seus dotes, conhecimentos e artifícios para pegá-las, mas como estavam fora do seu alcance, acabou se cansando em vão, e nada conseguiu. Desolada, cansada, faminta, frustrada com o insucesso de sua empreitada, suspirando, deu de ombros, e se deu por vencida. Por fim deu meia volta e foi embora. Saiu consolando a si mesma, desapontada, dizendo:"Na verdade, olhando com mais atenção, percebo agora que as Uvas estão todas estragadas, e não maduras como eu imaginei a princípio.” Apesar de ser bem simples, o texto acima é uma NARRAÇÃO, pois é um exemplo de fábula, exemplo de narrativa no qual animais assumem comportamentos humanos. No fim desses textos, costumam vir a moral da história, ou seja, o ensinamento que se quer realmente transmitir ao leitor.Porém nem todos os textos narrativos são fábulas. Há também as crônicas, os romances, os contos e as redações narrativas para concurso público. A NARRAÇÃO O texto narrativo possui como principal característica a existência e passagem do tempo, ou seja, os fatos vão acontecendo, um após o outro, até chegarem ao final. Composta de narrador e personagens, a narração relata um fato ou uma sucessão de fatos acontecidos, durante um determinado tempo. Nesses textos sempre se respondem às seguintes perguntas: Onde? quando? com quem ? Quando? ELEMENTOS NARRATIVOS Entendemos que o texto narrativo se caracteriza pelo relato de um determinado acontecimento. Assim, para que a história (o enredo) seja dotada de sentido, ela conta com a participação de alguns elementos imprescindíveis à sua desenvoltura, razão pela qual o artigo em questão tem por finalidade evidenciar de forma detalhada as características inerentes a tais elementos. Dessa forma, atentemo-nos aos pressupostos que seguem: Personagens – Semelhantemente a outros elementos, concebem-se como fundamentais ao enredo. Caracterizam-se como peças fundamentais que, de acordo com a habilidade do emissor, vão se tornando cada vez mais familiares aos nossos olhos, à medida que participamos ativamente da história. As personagens, por sua vez, não precisam ser adornadas ao extremo nem desajustadas ao ponto de “fugir do convencional”. Basta apenas que sejam bem construídas, obedecendo aos padrões de coerência. Dessa forma, há aquelas personagens que revelam sua participação na história de forma mais contundente – também conhecidas como protagonistas, heróis ou personagens principais. Como também existem as que se opõem a elas – denominadas de antagonistas, que nem por isso ficam em segundo plano mediante o transcorrer dos fatos. Juntamente com elas há outras – concebidas como secundárias, as quais colaboram para a sustentação da trama. Tempo – revela sua fundamental importância, pois retrata a duração em que se dá a ação. Podendo este ser cronológico, ou seja, demarcado pelos dias, meses, anos, séculos, horas, minutos, segundos. E o psicológico – relativo à duração interior dos acontecimentos – vivenciado pelas lembranças e pelos sentimentos das personagens. Por isso, nele percebemos que muitas vezes há a fusão do presente, passado e futuro. Espaço – Assim como ocorre no tempo, há o espaço físico – o qual revela o ambiente onde se movem as personagens, podendo ser ao ar livre, numa choupana, numa bela praia, enfim, entre tantos outros lugares. Existem determinadas narrativas, como, por exemplo, os romances regionalistas, os quais são amplamente determinados pelas características do local onde os fatos se desenrolam. Quanto ao espaço psicológico, este é revelado pela experiência subjetiva dos participantes. Narrador – Age como uma espécie de intermediário entre a história contada e o receptor, podendo atuar de distintas formas, entre as quais destacamos: * Narrador-personagem - Nesta modalidade ele participa de alguma forma do enredo, pois, ao mesmo tempo em que conta, demonstra também sua cota de envolvimento com a trama, geralmente narrada em 1ª pessoa. * Narrador-observador - Neste caso, a narrativa revela-se em 3ª pessoa, visto que o narrador apenas observa do lado “de fora” e, de forma imparcial, repassa ao leitor o que realmente acontece, limitando-se a revelar somente o que vê, nada mais que isso. * Narrador-onisciente - Este, além de saber tudo sobre o enredo, ainda sabe até o que os personagens pensam, revelando ao leitor os pensamentos e os sentimentos mais íntimos destes. Chega, às vezes, a revelar até o que as personagens nem sabem, fundindo-se no que chamamos de discurso indireto livre – o qual é narrado em 3ª pessoa e a voz do narrador muitas vezes se confunde com o pensamento dos participantes. Um importante detalhe ao qual devemos nos atentar reside no fato de que nunca podemos confundir autor com narrador. O autor revela-se como uma pessoa de carne e osso, como é o caso de Machado de Assis, Eça de Queiroz, Clarice Lispector, como também pode ser qualquer outra pessoa, não apenas representante da arte literária em si. O narrador é quem se revela como uma personagem de total autonomia para dar rumo aos fatos que deseja relatar, pois o enredo somente se materializa porque ele existe. * Discurso – Relaciona-se à própria mensagem que nos é transmitida. A construção do enredo Enredo é a sequência de acontecimentos da história, a rede de situações que as personagens vivem, a trama das ações que elas fazem ou que elas sofrem. Podemos identificar quatro partes que compõem o enredo: 1- Apresentação: é a parte do texto em que são apresentados alguns personagens e expostas algumas circunstâncias da história, como o momento e o lugar em que a ação se desenvolverá. Cria-se um cenário e uma marcação de tempo para os personagens iniciarem suas ações. Nem todo texto narrativo tem essa primeira parte; há casos em que já de início se mostra a ação em desenvolvimento. 2 – Conflito gerador: é a parte do enredo em que as ações e os conflitos são desenvolvidos, conduzindo o enredo ao clímax. 3 – Clímax: é o ponto em que a ação atinge seu momento crítico, momento de maior tensão, tornando o desfecho inevitável. 4 – Desfecho: é a solução do conflito produzido pelas ações dos personagens. Se não houver conflito, a narrativa fica reduzida a um relato, a uma sequência de fatos que não despertarão o interesse dos leitores. EXEMPLOS DE NARRATIVAS O nariz Era um dentista respeitadíssimo. Com seus quarenta e poucos anos, uma filha quase na faculdade. Um homem sério, sóbrio, sem opiniões surpreendentes, mas de uma sólida reputação como profissional e cidadão. Um dia, apareceu em casa com um nariz postiço. Passado o susto, a mulher e a filha sorriram com fingida tolerância. Era um daqueles narizes de borracha com óculos de aros pretos, sobrancelhas e bigodes que fazem a pessoa ficar parecida com o Groucho Marx. Mas o nosso dentista não estava imitando o Groucho Marx. Sentou-se à mesa do almoço – sempre almoçava em casa – com a retidão costumeira, quieto e algo distraído. Mas com o nariz postiço. – O que é isso? - perguntou a mulher depois da salada, sorrindo menos. – Isto o que? – Esse nariz. – Ah, vi numa vitrine, entrei e comprei. – Logo você, papai... Depois do almoço ele foi recostar-se no sofá da sala com fazia todos os dias. A mulher impacientou-se. – Tire esse negócio. – Por quê? – Brincadeira tem hora. – Mas isto não é brincadeira. Sesteou com o nariz de borracha para o alto. Depois de meia hora, levantou-se e dirigiu-se para a porta. A mulher o interpelou: – Aonde é que você vai? – Como, aonde é que eu vou? Voltar para o consultório. – Mas e esse nariz? – Pense nos vizinhos.Pense nos clientes. Os clientes, realmente, não compreenderam o nariz de borracha. Deram risadas (“Logo o senhor doutor...”), fizeram perguntas, mas terminaram a consulta intrigados e saíram do consultório com dúvidas. – Ele enlouqueceu? – Não sei – respondia a recepcionista, que trabalhava com ele há 15 anos. - Nunca vi ele assim. Naquela noite, ele tomou seu chuveiro, como fazia sempre antes de dormir. Depois, vestiu o pijama e o nariz postiço e foi se deitar. – Você vai usar esse nariz na cama? - perguntou a mulher. – Vou. Aliás não vou mais tirar esse nariz. – Mas, por quê? – Por que não? Dormiu logo. A mulher passou a metade da noite olhando para o nariz de borracha. De madrugada começou a chorar baixinho. Ele enlouquecera. Era isto. Tudo estava acabado. Uma carreira brilhante, uma reputação, um nome, uma família perfeita, tudo trocado por um nariz postiço. – Papai... – Sim , minha filha. – Podemos conversar? – Claro que podemos. – È sobre esse seu nariz. – O meu nariz, outra vez? Mas vocês só pensam nisso? – Papai, como é que nós não vamos pensar? De uma hora para outra, um homem como você resolve andar com um variz postiço e não quer que ninguem note? – O nariz é meu e continuar a usar. – Mas por que, papai? Você não se dá conta de que se transformou no palhaço do prédio? Eu não posso mais encarar os vizinhos, de vergonha. A mamãe não tem mais vida social. – Não tem porque não quer... – Como é que ela vai sair na rua com um homem de nariz postiço? – Mas eu não sou “ um homem”. Sou eu. O marido dela . O seu pai. Continuo o mesmo homem. Um nariz de borracha não faz nenhuma diferença. – Se não faz nenhuma diferença, então por que usar? – Se não faz diferença, por que não usar? – Mas, mas... – Minha filha. – Chega! Não quero mais conversar. Você não é mais meu pai! A mulher e a filha saíram de casa. Ele perdeu todos os clientes. A recepcionista, que trabalhava com ele há 15 anos, pediu a demissão. Não sabia o que esperar de um homen com um nariz postiço. Evitava aproximar-se dele. Mandou o pedido de demissão pelo correio. Os amigos mais chegados, numa última tentativa de salvar sua reputação,o convenceram a consultar um psiquiatra. – Você vai concordar – disse o psiquiatra, depois de concluir que não havia nada errado com ele – que seu comportamento é um pouco estranho... – Estranho é o comportamento dos outros! - disse ele. - Eu continuo o mesmo. Noventa e dois por cento do meu corpo continua o que era antes. Não mudei a maneira de vestir, nem de pensar, nem de me comportar. Continuo sendo um ótimo dentista,um bom marido, bom pai, contribuinte, sócio do Fluminense, tudo como antes. Mas as pessoas repudiam todo o resto por causa deste nariz . Um simples nariz de borracha. Quer dizer que eu não sou eu, eu sou o meu nariz? – É... - disse o psiquiatra – Talvez você tenha razão... O que é que você acha, leitor? Ele tem razão? Seja como for, não se entregou. Continua a usa nariz postiço. Porque agora não é mais uma questão de nariz. Agora é uma questão de princípios. Veríssimo, Luís Fernando. O analista de Bagé. Porto Alegre, Palotti,1981. p.39-41. |
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quero enviar a minha redação,não estou conseguindo.
ResponderExcluiracredito que vou aprender muito com você Rogério,pois quero me preparar pra futuras redações que vou fazer.obrigado.
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